Killers of the Flower Moon
Killers of the flower moon
Martin Scorsese · 2023
Crítica de Martim Pereira
Review exclusiva do site, publicada em Março de 2025
O filme Killers of the flower moon é o mais recente filme do emblemático realizador Martin Scorsese, contando com a participação de Leonardo DiCaprio, do seu colaborador de longa data, Robert DeNiro, e de Lily Glasgow.
O filme, baseado no aclamado livro com o mesmo título, conta a história de uma tribo de indígenas, os Osage, que depois de encontrarem uma jazida de petróleo constroem uma comunidade em Pawhuska, Oklahoma. Esta nova prosperidade, traz atenções negativas para a tribo. Os “novos Americanos” vêm os Osage como um povo ainda muito rural, que não saberia sequer o que fazer com aquele dinheiro. Passam a ser postos à prática vários esquemas que visam roubar aos Osage esta riqueza.
O maior desses esquemas é protagonizado por William K. Hale (DeNiro), magnata muito próximo à comunidade, e pelo seu sobrinho, Ernest Buckhart (DiCaprio), que voltou da Guerra e procura construir vida no Oklahoma. Depois de Buckhart se ter aproximado da Indígena Molly (Glasgow), Hale manipula-o para que se case com ela e se livre de todos aqueles (eventualmente a própria esposa) que, em vida, receberiam o direito de posse daquelas terras.
Scorsese disse que o plano era ilustrar um genocídio vagaroso. Acho que nesse aspeto foi muito bem-sucedido. Pawhuska parece cada vez mais deserta a cada homicídio. O próprio método que escolhem para matar Molly (envenenamento) faz com que deterioração da sua condição física nos remeta para as mortes que se alastram pelo seu povo como um cancro. A gradual erradicação da sua linhagem parece uma alegoria no mundo real para o que se passa no seu corpo. Essa é, em geral, a grande força do filme.
O crescente desespero de Ernest, que está cada vez mais lúcido daquilo que está a fazer; Molly, que está cada vez mais fraca; Os Osage, que são cada vez menos, e perdem a pouca confiança que tinham nos homens brancos; E Hale, cuja ganância o torna cada vez mais impaciente; são narrativas que se movem ao mesmo tempo e colidem no terceiro ato, que é, para mim, quando o filme se torna numa espécie de thriller. O perigo que sub-repticiamente esteve sempre presente torna-se agora central.
Há que notar que, antes do terceiro ato, muitos podem achar que a narrativa evolui de forma lenta, mas eu argumentaria que isso só traz mais impacto ao terceiro ato. Por falar em impacto, uma das poucas coisas em que eu não consigo defender este filme é o seu final. Escolheram tornar o filme mais “meta” o que certamente agrada a muita gente, eu só não sou uma dessas pessoas. Para mim retirou mais à narrativa do que adicionou a um realizador já tido como brilhante.
Gostava de sublinhar, também, o meu apreço pelas performances do elenco, sobretudo das personagens principais. Glasgow tinha o desafio de interpretar uma personagem cujas expressões faciais, gestos, tom de fala, eram essenciais para criar a atmosfera desejada, e que, na minha opinião, não deixou a desejar. Quanto a DiCaprio e De Niro, a dinâmica entre eles lembra as que já vimos em dramas de renome como ”Breaking Bad” ou “Os Sopranos”.
DiCaprio o rapaz inocente e ingénuo, e De Niro a sua figura parental que o utiliza como meio para alcançar o que quer. O filme pretende colocar a ganância do homem branco em primeiro plano, e De Niro encapsula-a na perfeição. Já DiCaprio dá-nos a performance expressiva a que nos tem vindo a habituar. Tenho especial apreço pela forma como interpreta uma personagem que, claramente, não está no seu auge das suas faculdades mentais. Fazer uma performance cartunesca de alguém descompensado, como em “Rain man”, por exemplo, é muito mais fácil do que se perder no papel. Ninguém nos fala sobre as incapacidades de Ernest, nós não temos escolha senão percebê-lo pela performance de DiCaprio.
Em geral, achei este filme muito satisfatório. Não foge muito à temática do crime organizado já característico de Scorsese, e, ao mesmo tempo, entrega-nos algo muito mais orgânico. Com um final diferente, acredito que este filme teria sido muito melhor, mas não deixo de achar que daqui a uns anos será visto como um clássico.