Opinião de Lara Santos
Artigo exclusivo do site, publicado em Março de 2025
O dia da mulher é uma data que assinala os esforços contínuos que as mulheres têm realizado ao longo dos últimos séculos pela igualdade. Apesar das melhorias significativas que têm sido implementadas, a verdade é que há ainda um longo caminho a percorrer, pelo que esta data nunca perderá a sua relevância. Assim, neste artigo, escrevo uma reflexão sobre como foi crescer com a minha avó, uma mulher que viveu a sua adolescência durante o Estado Novo, mas que sempre lutou pelos seus direitos.
Proveniente do Fundão, a minha avó fez toda a sua vida na cidade do Porto. Apesar dos entraves ao acesso à educação, conseguiu estudar, tornando-se uma mulher capaz de ler e escrever, competências que ela diz terem sido cruciais na sua vida.
Em 1969, pleno Estado Novo, conhece o meu avô que em 1973 parte para a guerra colonial. Apesar do cenário de caos que se verificava em outras regiões, o meu avô ficou colocado em Cabo Verde, uma antiga colónia onde não se registaram conflitos armados graves. Assim, os meus avós foram mantendo o contacto e trocando cartas ao longo dos dois anos que se seguiram, cartas essas que a minha avó guarda até hoje e que a relembram constantemente da importância que a literacia teve na sua vida.
Terminado o Estado Novo, a minha avó tornou-se uma aficionada por política. Lembro-me de ser pequena e viajar com ela para irmos a vários comícios. Dizia-me que um dia eu ia ter idade para votar e que, quando esse momento chegasse, eu teria o dever de exercer o meu direito ao voto. Mãe de três filhos homens, apoiava-se em mim e nas minhas primas para contar como era ser mulher antes do 25 de abril e dos vários direitos que já haviam sido conquistados desde essa data, tais como: o direito ao aborto, o direito ao divórcio e a institucionalização da violência doméstica como um crime. No entanto, tinha plena consciência de que ainda havia um longo caminho pela frente e fazia questão de dizer que contava connosco para dar seguimento a esta luta.
No entanto, não quero transparecer a ideia de que viveu uma vida fácil, pois vários sonhos foram-lhe restringidos apenas por ser mulher. Embora tivesse o sonho de conduzir, por exemplo, o estigma da sua família e, mais tarde, a degradação das suas condições de saúde, impossibilitaram-na de tal.
Desta forma, o Dia da Mulher é um dia que tem particular peso para mim e para as mulheres da minha família, pois reconhecemos os esforços crescentes que têm sido realizados para o alcance da igualdade, fazendo questão de os celebrar. Realizando uma análise da minha própria vida, atualmente frequento um mestrado, trabalho, voto e conduzo, por exemplo. Tudo isto só me foi possibilitado graças, por um lado, aos esforços incessantes das mulheres ao longo das últimas décadas e, por outro, ao incentivo e apoio dos meus pais e avós, que sempre me mostraram que eu poderia ter um propósito além dos papéis tradicionais de esposa, mãe e dona de casa.
Não obstante, tenho a consciência de que nem todas as mulheres têm a sorte de viver esta realidade e que experienciam uma vida de submissão, maltrato, opressão ou de negação do seu livre arbítrio. Daí a importância do Dia da Mulher: relembrar que há ainda um longo caminho a percorrer e que esta luta só acaba quando atingirmos a igualdade em todas as esferas da vida humana e essa igualdade for sentida e vivenciada por todas as mulheres do Mundo.
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