Sendo o entrevistador mais conceituado em Portugal, como é estar desse lado, enquanto entrevistado?

Com o passar dos anos, vou compreendendo o interesse que possa despoletar, junto de outras pessoas, aquilo que eu faço e, como tal, é um papel que encaro com normalidade e pensando que o meu contributo, enquanto entrevistado, poderá ser útil para quem me entrevista.

E acredita que é mais fácil ser-se um bom entrevistador passando pelo lugar de entrevistado?

A preparação de uma entrevista é algo que me dá muito trabalho e gozo ao mesmo tempo. E é nessa mesma preparação que reside um dos factores fundamentais para o programa Alta Definição durar há tantos anos. Para ser entrevistado, não tenho de preparar nada. É um exercício onde me sinto mais à vontade a determinar o tom da conversa e isso só se consegue, de forma mais objectiva, estando do lado de quem pergunta do que do lado de quem responde. Julgo que os dois lados se complementam.

Tem algum nome de referência no campo das entrevistas por o qual se guie?

Não, não tenho. O que procurei, desde muito novo, sem ainda ter consciência de que faria da entrevista o meu meio referencial, foi antever muitas delas, nos mercados português, brasileiro e americano. Vê-las por gozo. Sobretudo no Brasil, há muito a política de se perguntar objectivamente aquilo que se quer saber. Cá, nós temos menos criatividade e mais receio a questionar. Portanto, sempre encarei a entrevista como um acto de perguntar aquilo que se quer, ainda que isso não seja muitas vezes feito de forma objectiva. A pessoa pode chegar à resposta sem que, por vezes, haja uma pergunta para que ela chegue a essa resposta.

Porque é que aceitou conceder-nos esta entrevista?

Apesar de esta ser uma altura complicada, há alturas muitíssimo mais complicadas, em termos de agenda. Posto isto, o facto de o convite ter surgido nesta fase e ter sido tão simpático fez com que eu o aceitasse.

Apesar de ter, apenas, 33 anos, como é que se gere o sucesso de se ser já director de um canal, ter um programa que é dos mais acarinhados em Portugal e ter já vários livros editados?

Não se faz de forma muito preocupada. Eu não estou a gerir o meu sucesso. Gosto daquilo que faço e, portanto, obrigo-me a ser melhor daquilo que fui na entrevista e no programa anteriores. Procuro, também, corresponder às minhas próprias expectativas em relação àquilo que executo, ao trabalho que tenho e às pessoas com quem trabalho. Julgo que, com método e fazendo as coisas por gosto, o tempo despendido não é visto como uma obrigação mas sim como um prazer. É isso que eu procuro quando escrevo livros ou quando faço programas. Há uma dose de responsabilidade profissional mas há, também, um gosto em fazer aquilo que faço. E sou um privilegiado nesse sentido.

Julga que ter esse gosto é fundamental para que se transpareça um bom trabalho?

Não, acredito que não seja fundamental. Na vida, nós não fazemos sempre aquilo que queremos. E também na televisão assim acontece. No meu caso, faço aquilo que gosto mas não é obrigatório que assim seja para que o trabalho saia bem feito. Já fiz, noutras ocasiões, coisas com as quais não me revia tanto nem retirava tanto gozo. Em todo a caso, fazia-as mantendo o mesmo grau de comprometimento com o trabalho que tenho agora.

Já tendo realizado centenas de entrevistas, qual aquela que mais o marcou e porquê?

Há várias que me marcaram por razões diferentes… por terem personalidades diferentes. Por exemplo, há uns dias marcou-me muito o Henrique Cymerman porque ele nos trouxe uma perspectiva dele próprio e da vida que é muito particular e uma visão diferente do conflito no Médio Oriente. Mas também me marcaram o Manuel Forjaz, o António Feio, o Artur Agostinho, … São vários os exemplos. Uma das coisas que tenho sentido, ao longo destes últimos cinco anos, é que tenho aprendido imenso com cada um dos convidados. E daí partir sempre com um interesse redobrado para cada entrevista porque sei que vou ter uma perspectiva diferente sobre a vida na esmagadora maioria dos casos.

Não consegue, portanto, salientar um nome que mais o marcou?

É difícil! Muitos marcaram-me de formas distintas: o António Feio pela coragem, pela sobriedade e pela dignidade daquele momento; o Artur Agostinho pela longevidade de ter 90 anos e ter um pensamento mais jovem do que se calhar todos os convidados que por aqui passaram. É muito difícil escolher só uma entrevista porque as pessoas são diferentes e os contextos também o são. Em analogia, se calhar, é como escolher o nosso melhor destino de férias: provavelmente não há só um, há vários.

Sendo complicado salientar o melhor entrevistado que já teve, pode-nos revelar se há alguém que espera, no futuro, que receba esse “título”?

Não, por uma razão simples: a experiência diz-me que o melhor entrevistado pode não ser, e muitas vezes não o é, aquele que se espera que o seja. Por outras palavras, a dimensão de uma figura não é um factor indiciador de nos conceder a melhor entrevista. Às vezes, a melhor vem daquela pessoa da qual não o esperaríamos. Talvez para o público a expectativa seja muito superior de ver certos nomes a serem convidados, o que não quer dizer que isso seja uma garantia de alguma coisa.

Há algum momento que recorde, numa entrevista, que saiu fora do controlo e o tenha deixado embaraçado?

Há muitas que saíram do que estava previsto e aí reside o fascínio da entrevista. Contudo, saem no sentido de serem concedidas mais informações e momentos mais intimistas. Para o contexto que a pergunta indica, não me recordo de nada em particular, ao ponto de ter ficado constrangido.

Não se torna complicado chegar a um nome, todas as semanas, para o programa Alta Definição?

Depende, mas não podemos ficar circunscritos a uma só opção. Para dar um exemplo, já tenho todo o programa esquematizado até ao final deste ano, desde o ano passado. O que não quer dizer que eu saiba quem vou entrevistar em cada altura. Tenho vários nomes de pessoas perfiladas para aquelas datas, por forma a ter várias opções para cada uma delas.

Em norma, essas pessoas estão receptivas ao convite?

Depende, também, de caso para caso. Há pessoas que não se sentem à vontade para falar num certo momento das suas vidas já que aquele pode não se revelar o momento oportuno. E, muitas vezes, essa entrevista fica adiada. Já nos aconteceu, com muitas pessoas, não a darem numa altura e, posteriormente, concederem-na noutra fase. E é muito mais benéfico para o programa que a pessoa venha quando se sente preparada e motivada para o fazer e, aí, cada momento flui de uma forma muito diferente.

Apesar de ter começado a trabalhar em televisão com 16 anos e ter já muitos anos de carreira, tem, ainda, muitos mais anos pela frente. Quais os projectos que se seguem?

Fazer melhor aqueles que faço. Nós temos muito a ideia que precisamos de mais projectos para nos realizarmos. Eu estou, neste momento, a gerir 4 programas e um canal, e, se eu os conseguir gerir da forma como pretendo, já fico muito satisfeito. O segredo está em saber renovar esses projectos, de forma a torná-los aliciantes para quem os faz e para quem os vê.

E no campo pessoal e familiar não é expectável que tenhamos novidades?

(Sorrindo.) Hum… Não.

Quais são os seus receios em relação ao futuro?

Que nós não tenhamos ferramentas necessárias para construir as nossas liberdades individual e colectiva. Julgo que esse é um dos problemas da sociedade actual, não só pela crise, mas também pela própria evolução da sociedade. Não podemos ficar reféns da perda de um emprego ou de um empréstimo bancário. E, portanto, temo que nós não consigamos gerir a nossa própria liberdade. A nossa felicidade está muito ligada à nossa liberdade.

Qual aponta como sendo a sua maior virtude? E o seu maior defeito?

A minha grande virtude é a capacidade de trabalho. Sei que a tenho, mas não tenho grande mérito nisso, porque me é natural. Em relação aos defeitos, não tolero facilmente o erro, mas tenho vindo a melhorar, nesse aspecto, porque apercebo-me que o erro faz parte. As coisas têm que ser construídas em cima do erro.

Há uma proximidade óbvia entre aquilo que diz ser e a forma como os outros o vêem?

Julgo que sim, embora possam ser colocadas noutras palavras. Dirão que tenho pouca tolerância ao erro, mas numa forma mais violenta. Quanto à capacidade de trabalho, parece-me consensual.

E o Daniel Oliveira que vemos na televisão é semelhante ao que está em família e com os amigos?

A minha curiosidade é semelhante, mas quando estou na televisão tenho que estar sentado de determinada maneira, não como estou em casa no sofá. Agora, fora de brincadeira, acho que aquilo que eu sou está patente naquilo que eu faço: tanto a minha curiosidade como o facto de não entrar com juízos de valor à partida em qualquer entrevista.

O que vale, realmente, a pena nesta vida?

Não perdermos muito tempo com as coisas mais pequenas. Acho que vale a pena estarmos próximos daqueles que nos são mais queridos e fazer alguma coisa para que essas pessoas que estão ao nosso lado tenham uma melhor condição de vida. Além disso, não deixar um livro por ler e não criticar senão de forma fundamentada. Acho que vale a pena olharmos mais para o outro e para os nossos.

O que o move e comove?

O que me move é aquilo que eu vejo como útil, tanto para mim como para o receptor daquilo que eu faço. Comove-me a forma como tratamos os mais velhos, como desprezamos o tanto que eles sabem. Nesta vida tão agitada, perdemos muito pouco tempo a olharmos para os mais velhos. Eu vejo-o como um dever e dedico muito tempo àqueles que são os mais velhos da minha família.

Como é que vê o nosso país neste momento?

É uma imagem de um Portugal ainda à procura de um caminho que, ainda assim, já vê uma luz ao fundo do túnel – uma luz. Apenas espero que não seja a de um comboio em contramão! Julgo que o pior que já pode ter passado, neste contexto de crise, mas parece-me que somos um país ainda à procura da nossa identidade. Identidade no sentido de não lutarmos cada um por si e de aproveitarmos os recursos que nos são tão gratos. Num país tão pequeno e que nunca foi auto-sustentável, creio que nunca conseguimos potencializar os nossos recursos: o turismo, por exemplo. Contudo, o que fará sempre a diferença será a forma como pensamos, por isso a nossa capacidade criativa e criadora recai num investimento na educação que nos poderia levar a ser grandes, mesmo neste pequeno país. Acho que questionamos menos do que deveríamos questionar!

O que podem os estudantes esperar nos próximos anos, depois de terminadas as licenciaturas?

Há uma frase que diz que a melhor forma de prever o futuro é criá-lo. Eu acho que está nas vossas mãos muito do que é preciso fazer, sabendo que a vossa geração está muito mais bem preparada do que aquelas que vos antecederam. E, portanto, têm muitas mais ferramentas para mudar o curso das coisas. Acho que está muito nas vossas mãos a forma como o futuro vai ser e a forma como vão conseguir pegar naquilo que vos está a ser deixado ou não. Mas, claro, com outra perspectiva, com outro olhar, com juventude e com irreverência. No entanto, acho que o futuro vai ser essencialmente bom! Saliento também que o futuro do país está também nas vossas mãos.

Não acredita que esta geração mais bem preparada não o é em termos teóricos e em detrimento de uma vertente mais técnica/prática?

Conhecer não é só o que se aprende na faculdade e na escola. Conhecer é viver! Quantas mais perspectivas nós tivermos e não apenas as teóricas, mais facilidade teremos para reagir àquilo que nos possa acontecer. A experiência não se transmite a ninguém, apenas se aprende passando por ela. Portanto, esse gap entre o sentido prático e o teórico está muitas vezes na percepção que nós temos da realidade, que poderá estar deformada pela teoria que nos é passada, ainda que a teoria seja fundamental. O saber comparar a teoria com a realidade é muito importante e a realidade tem muito a ver com o sentido prático das coisas.

Por fim, terminamos com a questão tão aguardada: «O que dizem os teus olhos», não valendo responder que «o melhor está para vir»?

Os meus olhos dizem que vale a pena que nós consigamos olhar para o futuro e vermos a linha do horizonte que lá está… corrermos atrás dela, mesmo que possamos não chegar até lá. A verdade é que se a vemos é porque a podemos alcançar. Portanto, vale a pena não nos apoucarmos da nossa realidade e fazermos de cada problema uma oportunidade.