A Farfetch foi criada em 2008 pelo português José Neves, consistindo numa plataforma global de tecnologia para a moda de luxo, trabalhando em parceria com marcas e boutiques em todo o mundo. O que distingue este marketplace da primeira geração de sites de e-commerce de luxo é a ausência do risco de compra e de retenção de stock, operando a empresa num sistema de zero inventário. Assim como o Airbnb, é um exemplo perfeito de uma empresa facilitadora, ligando a oferta e a procura, em vez do que acontece no mais tradicional pipe business model, que se foca em empurrar a mercadoria do produtor para o consumidor.

A empresa unicórnio estreou-se na Bolsa de Valores de Nova Iorque em setembro de 2018, tendo sido um sucesso inegável. As ações aumentaram perto de 50% do preço do IPO no primeiro dia de trading, fazendo com que a avaliação da plataforma passasse os 8 biliões de dólares. No entanto, um ano depois, a empresa enfrentou preocupações acerca da sua falta de lucros e dos elevados custos para adquirir clientes, uma vez que, assim como os seus rivais (Net-a-Porter e MyTheresa por exemplo), é um site largamente indiferenciado, vendendo na maior parte das vezes os mesmos produtos aos mesmos preços. Adicionando a estes problemas, a confiança por parte do mercado caiu ainda mais quando a Farfetch comprou a New Guards Group, uma manufatora milanesa de streetwear, o que culminou, em outono de 2019, no trading das ações a menos de 40% do seu preço IPO.

Depois chegámos a 2020, quando começaram os confinamentos devido ao coronavírus, que resultaram num histórico boom para o e-commerce de luxo. No meio de um congelamento do turismo e do encerramento intermitente das boutiques físicas, o e-commerce arrecadou uma quota de mercado sem precedente. As vendas online aumentaram 50% em 2020, apesar das receitas do setor terem caído 23%. E, mesmo que a quota de compras online diminua como é esperado ao longo de 2021, os consumidores dificilmente abandonam totalmente os hábitos digitais que adquiriram durante a pandemia.

Assim, no geral, as plataformas de e-commerce conseguiram beneficiar largamente com a pandemia, mas a Farfetch foi a que mais brilhou. Isto foi possível porque, o seu modelo descentralizado e com localizações distribuídas, que abastece o seu site através de um leque alargado de localizações, permitiu à empresa continuar a satisfazer encomen- das durante a pandemia, beneficiando desse aumento da procura digital. Ou seja, mesmo quando algumas marcas e suas boutiques foram impactadas pelos confinamentos, a empresa conseguiu continuar a satisfazer as encomendas através dos seus fornecedores que se conseguiram manter abertos.

Esta dramática reviravolta culminou no crescimento da sua capitalização no mercado em 475% em 2020. E, pela primeira vez na história, a empresa atingiu resultados operacionais positivos em 2020, passando o seu EBITDA ajustado de 18 milhões de dólares negativos em 2019, para 10,376 milhões de dólares positivos.

Hoje os investidores estão a apostar que a Farfetch irá cumprir a sua missão de se tornar o go-to marketplace para artigos de luxo, conectando criadores, curadores e consumidores: a Amazon do luxo.