O governo está, neste momento, a governar em duodécimos com o chumbo da proposta do Orçamento do Estado para o próximo ano de 2022. Isto significa que, a despesa mensal de cada organismo do Estado não pode ultrapassar um duodécimo da despesa total prevista no Orçamento do Estado de 2021, com algumas exceções.


“O Orçamento do Estado para 2022 é um orçamento amigo do investimento, dirigido às classes médias e focado nos jovens, mantendo as marcas dos orçamentos anteriores, como a aposta no SNS (Serviço Nacional de Saúde), o reforço da proteção social e o aumento do rendimento dos trabalhadores e dos pensionistas. E a garantia de contas certas”, são estas as palavras que o primeiro-ministro usou para descrever a proposta do orçamento no Parlamento.


Recusado por 117 deputados, numa votação em que 108 votaram a favor — sendo esses deputados na totalidade do PS — e outros cinco abstiveram-se, cai assim uma esquerda, um orçamento à esquerda e uma aliança à esquerda. Com este cenário de votação, caem também (da mesa) certas medidas como os novos “escalões” do IRS, isto é, desdobramento do 3.o e 6.o; a atualização salarial dos funcionários públicos; o aumento extraordinário das pensões e o reforço do Serviço Nacional de Saúde. Algumas destas medidas ainda podem ser concretizadas pelo Governo atual, incluindo o aumento do salário mínimo, existindo a possibilidade de entrar já em vigor em janeiro de 2022.


Apontaram-se dedos por todos os lados, o governo apontou à esquerda que se recusou a apoiá-lo, a esquerda ao governo e a direita aos dois. Apesar de João Leão, atual ministro das Finanças, ter anunciado que o governo estava aberto a negociar em especialidade, nem isso convenceu. Fala-se de uma falta de negociação, que seria exigida pelo compromisso com que foi criada a geringonça, por parte dos queixosos canhotos e de um orçamento que não visa ao crescimento por parte dos destros.


Surge aqui uma oportunidade para a direita se reerguer do (já algum) cansaço da gestão do governo, sendo ainda crucial a eleição interna do PSD, em data anterior às eleições. Contudo, há ainda o cenário de voltar tudo ao mesmo, afirmando-se a opinião de que a negociação do orçamento deve ser feita de forma diferente, e a mão socialista manter-se no poder de negociação.


Salienta-se que todos estes acontecimentos só vêm demonstrar que não há só dois blocos políticos em Portugal e que a esquerda difere da esquerda. Estes impasses são importantes para a democracia, mostrando não existir uma maioria absoluta garantida a todas as ações deste governo.


Portugal encontra-se assim, numa situação política bastante sensível, com a dissolução da Assembleia da República e a ida a eleições legislativas antecipadas. Estas já estão previstas para o início do próximo ano. Desta forma, só teremos um novo orçamento em abril, o que pode intimidar a recuperação pós-pandemia que estamos ainda a percorrer. Não havia um chumbo do orçamento desde 1978, quando Portugal estava sob um programa de austeridade e o motivo da rejeição no parlamento foi o corte do subsídio de Natal.