Opinião de Bernardo Marta e Rui Pedro Graça
Também incluído no FEPIANO 44, publicado em Outubro de 2021
Após a noite eleitoral do passado dia 26 de setembro, podemos facilmente concluir que, por mais estranho que pareça, houve dois vencedores – sendo estes o Partido Socialista (PS) e o Partido Social Democrata (PSD). O Partido Socialista conseguiu manter pela terceira eleição consecutiva o maior número de autarquias em todo o país, passando das 161 câmaras municipais conquistadas em 2017 para 148. Por sua vez, o PSD cumpriu os objetivos delineados por Rui Rio, conseguindo passar de 98 para 114.

Contas feitas, o PS perdeu 13 municípios, enquanto o PSD conquistou mais 16 face à eleição de 2017. Este dado, possivelmente, leva-nos a considerar que o partido de António Costa foi o único grande vencedor da noite eleitoral, porém é necessário refletir sobre as câmaras perdidas para o PSD ou para as suas coligações. O Partido Social Democrata, para além de diminuir a distância face ao PS, conquistou vários municípios com grande significância a nível nacional – nomeadamente Lisboa, Coimbra e o Funchal que, certamente, arrecadaram consequências políticas quer a nível regional, quer a nível nacional. Houve várias trocas de mãos com independentes, sendo de assinalar a perda da Figueira da Foz do PS para o seu emblemático ex-autarca Pedro Santana Lopes.
Comecemos pela grande surpresa da noite, a vitória de Carlos Moedas face a Fernando Medina para a presidência da Câmara Municipal de Lisboa. Ao contrário do que todas as sondagens indicavam (algumas chegando a referir que Fernando Medina tinha cerca de 10 pontos percentuais de vantagens face a Moedas), o Partido Socialista acabou por perder a câmara da capital portuguesa, terminando assim um reinado socialista com mais de 14 anos. A inesperada vitória do PSD em Lisboa deveu-se principalmente a dois fatores: a falta de união das várias forças de esquerda que decidiram repartir-se em três candidaturas, enquanto a direita optou por fazer uma grande coligação na qual só ficaram de fora os liberais e os populistas e, aos vários escândalos que assombram o último ano da governação de Medina – como a má gestão dos festejos do Sporting em plena pandemia e, nomeadamente, os envios de dados relativos a manifestações para várias embaixadas. Portanto, a vitória da direita não é explicada pela sua força eleitoral, mas sim pelo dissenso à esquerda.
Relativamente a Coimbra e ao Funchal, a captura destas câmaras pelos sociais-democratas (ambas perdidas para o PS em 2013), marcam um ponto em que 9 das 18 capitais de distrito, assim como as capitais das 2 regiões autónomas, encontram-se nas mãos do PSD. A perda da câmara do Funchal levou à demissão do líder do PS Madeira, Paulo Cafôfo, enquanto a derrota do atual autarca coimbrense Manuel Machado, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) (tendo conseguido 32,65% face aos 43,92% obtidos pela coligação liderada pelo PSD), leva à necessidade de escolher uma nova direção para a ANMP.
Seria importante também referir que, apesar de uma grande ofensiva por parte do PS com o objetivo de conquistar os municípios de Viseu e de Portalegre, esses bastiões laranjas no interior do país não tombaram. Tal como, uma alteração da paisagem da política autárquica nos Açores – onde o número de municípios detidos pela direita (PSD e CDS-PP) iguala os mantidos pelo PS.
Apesar de o CDS-PP apenas ter conquistado cerca de 1,48% do voto nacional, que se traduz em pouco mais de 74 mil votos, os centristas conseguiram manter com maioria absoluta as 6 câmaras (Albergaria-A-Velha, Oliveira do Bairro, Ponte de Lima, Santana, Vale de Cambra e Velas) que conquistaram em 2017.
Já o LIVRE lançou-se em várias corridas autárquicas, sendo que participou em diversas coligações com eleitos, de destacar a eleição de um vereador do partido em Lisboa e de uma independente em Cascais. Também a coligação com o PS em Felgueiras foi vencedora.
Quanto às candidaturas independentes, houve um crescer do seu peso, elegendo 134 vereadores e 19 presidentes de câmara. Existem casos de Câmaras lideradas por independentes em todo o território nacional exceto no Sul, como a reeleição de Isaltino Morais em Oeiras, a conquista da Guarda e a perda da maioria absoluta de Rui Moreira no Porto.
Como em qualquer eleição, tanto há vencedores como perdedores. Iremos agora debruçar-nos sobre os derrotados da noite eleitoral. Do lado direito do espectro político, os vencidos são o CHEGA e a Iniciativa Liberal. O partido de André Ventura rumou para esta eleição numa maré de arrogância, com a perspetiva de que conseguiria capturar vários municípios, em particular alguns no Alentejo à custa do Partido Comunista Português. Nos resultados finais, o CHEGA não ganhou uma única câmara, obtendo 19 vereadores em todo o território nacional. Quanto à Iniciativa Liberal, este partido apanhou com uma “chuva de realismo” que os varreu para a sua insignificância a nível autárquico, não conseguindo eleger um único vereador.
À esquerda, o PAN manteve um resultado muito próximo do registado em 2017 (obtendo 57 mil votos), não elegendo nenhum Presidente de Câmara, nem qualquer vereador. O Bloco de Esquerda (BE) teve uma derrota bastante pesada, falhando novamente em capturar alguma câmara, mas mais dramático é o facto de ter perdido dois terços dos seus vereadores (passando de 12 para 4 – incluindo a independente Carla Castelo apoiada em coligação com o Livre e o Volt em Cascais), alguns dos quais foram perdidos para o partido nacionalista de André Ventura.
No entanto, a grande derrotada nestas eleições foi a CDU (coligação composta pelo Partido Comunista Português, pelo Partido Ecologista “Os Verdes” e pela Associação Intervenção Democrática). Apesar de ter reforçado a sua posição nos grandes centros urbanos, Porto e Lisboa, perdeu cerca de 80 mil votos em todo o país, o que significou a perda de 23 vereadores e a transição de 24 para 19 câmaras municipais – controlando a maioria dos concelhos do distrito de Setúbal. É também de salientar que houve a primeira eleição de um Presidente da Câmara d’ “Os Verdes”, André Martins, em Setúbal. O PS conseguiu conquistar 6 autarquias à CDU e perdeu outras 2 (conquistou-lhe Viana do Alentejo e Barrancos), o que muito provavelmente terá consequências na negociação do próximo orçamento de Estado. Entre as perdas encontram-se Moita, Montemor-o-Novo e Mora – municípios dominados pelos comunistas desde 1976.

Estas eleições traduziram-se num novo pior resultado de sempre para o PCP, um histórico partido que vê a sua base de eleitores a erodir com o passar dos anos, sem grande capacidade de captar camadas jovens e, por muitos, considerado um partido antiquado.
Resta agora apenas duas questões: Terão sido estas eleições um cartão amarelo a António Costa e ao PS? E que consequências na relação entre o PS e o PCP irão emergir desta eleição?
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