Clara dos Reis e Nuno Sousa
Também incluído no FEPIANO 37, publicado em Maio de 2019
As próximas eleições europeias, que irão ter lugar entre os dias 23 e 26 de maio, serão essenciais para determinar o caminho que a União Europeia vai tomar nos próximos anos. Pretendemos, por isso, promover o debate sobre a UE, encorajando os nossos leitores a informarem-se sobre a Europa e a votarem conscientemente nas próximas eleições europeias, contrariando a elevada abstenção que costuma caracterizar este ato eleitoral.
Nas eleições europeias, os cidadãos irão eleger 751 representantes para o Parlamento Europeu, para um mandato de 5 anos. Em particular, os portugueses irão eleger 21 eurodeputados. O número de eurodeputados que cada país elege varia consoante a população de cada país, seguindo um método proporcionalmente degressivo. Atualmente, os eurodeputados estão divididos em 8 grupos parlamentares, sendo o Partido Popular Europeu (PPE), ao qual pertencem o PSD e CDS, o partido com a maior representação no Parlamento Europeu, seguido pelo S&D, ao qual pertence o PS.
O Parlamento Europeu é a única instituição europeia cujos membros são diretamente eleitos pelos cidadãos europeus. Apesar de não possuir capacidade de iniciativa legislativa, partilha os poderes legislativos e orçamentais com o Conselho da UE, tem poderes de fiscalização em relação às outras instituições europeias, elege o Presidente da Comissão Europeia e tem o poder de demitir a Comissão.
A Comissão Europeia é a instituição com poderes executivos e propõe legislação, sendo constituída por 28 comissários (um por cada país-membro). Atualmente, o seu presidente é Jean-Claude Juncker e o comissário português é Carlos Moedas (Comissário para a Investigação, Inovação e Ciência). Desde 2014 que a escolha do presidente é feita pelo sistema de “Spitzenkandidat”, em que cada partido europeu nomeia o seu candidato à Presidência da Comissão Europeia antes das eleições europeias (tendo sido apresentados, entre outros, Manfred Weber, pelo PPE, e Frans Timmermans, pelo S&D). No entanto, existem cada vez mais críticos a este processo, principalmente dentro do Conselho Europeu (que terá sempre de aprovar o candidato).
Neste momento, discute-se o próximo quadro financeiro plurianual para o período 2021-2027, no qual se prevê um aumento das rubricas destinadas à Inovação, Segurança e Política Externa europeia, em detrimento da Coesão Territorial e da Agricultura (que mesmo assim, continuarão a representar combinadamente cerca de ⅔ do total) e que deverá atingir o valor de 1.135 mil milhões de euros (apenas 1,1% do PIB europeu). Atualmente, o orçamento europeu é financiado maioritariamente através de contribuições nacionais baseadas no IVA e no PNB. O aumento dos desafios que a UE enfrenta e a diminuição de receitas resultantes do Brexit têm levado a uma crescente discussão sobre a criação de receitas próprias, como senhoriagem e impostos sobre as transações financeiras, sobre o carbono ou sobre as empresas digitais.
Já o Conselho da UE (que não deve ser confundido com o Conselho Europeu) é um órgão colegislador, no qual se reúnem os ministros dos governos de cada país-membro, e cuja presidência é rotativa, de 6 em 6 meses, entre os Estados-Membros. Finalmente, o Conselho Europeu é o corpo constituído pelos chefes de Estado ou Governo que decide as prioridades políticas da União e ao qual preside, atualmente, Donald Tusk. Em ambas as instituições, o processo de decisão é feito por votação por maioria qualificada ou por unanimidade (em casos pontuais).
A União Europeia enfrenta atualmente muitos desafios. Nem sempre é fácil conciliar esses desafios com o que se passa no resto do mundo e até mesmo entre os países europeus, que têm os seus próprios interesses económicos e estratégicos. Enquanto o Brexit continua nas bocas do mundo e indicia uma quebra de união na Europa, vários acordos têm vindo a ser feitos para reforçar a cooperação entre os cidadãos europeus e o resto do mundo. Designadamente, a assinatura de três novos programas que integram a “Aliança África-Europa para o Investimento Sustentável e Emprego”; a criação da maior região do mundo com fluxos de dados seguros e a realização de um acordo comercial, ambos em parceria com o Japão; e o reforço da relação entre a União Europeia e a Liga dos Estados Árabes, através da adoção de uma declaração comum.
É necessário ressaltar, igualmente, a política de concorrência europeia, liderada pela Comissária Margrethe Vestager, que recentemente impôs multas a multinacionais como a Mastercard (em 570 milhões de euros) e a Google (em 1.490 milhões de euros). A redução de informação assimétrica e consequente risco moral é um objetivo alcançado pela aposta em mais regulação e pelo cumprimento dos princípios de subsidiariedade e proporcionalidade.
A UE é, hoje em dia, uma das regiões com maior regulação ambiental, assumindo um papel de liderança nas negociações internacionais sobre as alterações climáticas, tendo-se comprometido a reduzir em 40% as emissões de GEE até 2030 e a seguir uma estratégia de redução de plástico.
Não podíamos deixar de destacar o vigésimo aniversário da União Monetária, que se celebra no corrente ano. Atualmente, o euro é a moeda oficial de 19 países, sendo utilizado por mais de 340 milhões de pessoas. O BCE (liderado por Mario Draghi) e os bancos nacionais formam, no seu conjunto, o Eurosistema, cujo principal objetivo é a estabilidade dos preços, sendo responsável pela supervisão prudencial das instituições financeiras.
A crise financeira da última década mostrou-nos que é cada vez mais urgente completar os três pilares da União Bancária e, em particular, terminar o Mecanismo Único de Resolução e implementar o Sistema Europeu de Seguro de Depósitos. Adicionalmente, para fortalecer a UEM, é necessário realizar a União dos Mercados de Capitais e considerar a criação de um ativo seguro europeu, que melhoraria a estabilidade financeira. Estas medidas são essenciais para a redução e partilha dos riscos no setor bancário e para a melhoria do financiamento à economia real. Outras medidas que poderão fortalecer a UEM são a criação de instrumentos de mutualização das dívidas soberanas e a criação de um Fundo Monetário Europeu.
A integração económica e a convergência real entre países-membros só poderão ser alcançadas através do reforço das ligações entre as prioridades do Semestre Europeu (trata-se de um ciclo de coordenação de políticas na UE e foca-se em reformas estruturais, políticas orçamentais e prevenção de desequilíbrios macroeconómicos) e os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento, enquadrada numa UEM reformada, que concilie a União Financeira com o Mercado Único Digital, a União da Energia, o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e uma crescente harmonização fiscal, sem esquecer uma maior responsabilização e transparência democrática. Adicionalmente, os governos europeus já decidiram a criação, nos próximos anos, de um orçamento da zona euro, que tenha uma função de estabilização macroeconómica.
Em suma, na União Europeia, impõem-se objetivos como: a gestão da liberdade de expressão, melhorando a segurança pública; o alcance da sustentabilidade ambiental aliada à produtividade económica; e a regulação e supervisão económica e monetária face a potenciais crises.
A base da vida em união na UE pode assim ser resumida na seguinte declaração de Winston Churchill, um dos fundadores da União Europeia: “Esperamos ver uma Europa onde cada cidadão de cada país se sinta tão europeu como da sua terra nativa, e… onde quer que vá no largo domínio europeu… possa sentir verdadeiramente – Aqui eu estou em casa.” Tal só será possível com o reconhecimento das falhas do sistema em vigor e dos próprios agentes que o integram, de uma regulação forte e justa, e de uma união aos mais diversos níveis e democrática, e na qual todos devemos participar ativamente enquanto cidadãos europeus.
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