Opinião de Luís Manuel Oliveira
Também incluído no FEPIANO 37, publicado em Maio de 2019
Um dos slogans mais repetidos durante a campanha a favor do Brexit era que 350 milhões de libras saíam semanalmente do Reino Unido para a União Europeia, fundos que, argumentavam, podiam ser usados no Serviço Nacional de Saúde britânico na eventualidade da saída da UE. Apesar de esta alegação ter sido disputada e claramente não representar a realidade, pois simplificava uma rede de fluxos extremamente complexos, o slogan teve uma contribuição fundamental para a vitória da campanha a favor da saída no referendo de 2016 e expôs uma problemática que a Europa enfrenta atualmente – a Solidariedade Europeia é uma realidade ou um obstáculo à continuação do projeto Europeu?
A que título surgiu a necessidade desta solidariedade? Bem, de uma forma simplificada, esta visa que, economicamente, não exista uma “Europa de Primeira” e uma “Europa de Segunda”, com claras diferenças estruturais que permitam diferentes níveis de vida. Isto porque existe a crença que, se estes níveis forem homogéneos dentro da União, será mais fácil definir políticas macroeconómicas que beneficiem todos os estados membros, de forma que o resultado seja um maior crescimento económico agregado. Daí a necessidade que os países mais desenvolvidos da União contribuam de forma a que exista convergência económica interna.
O caso do Brexit demonstra claramente que existem forças dentro dos países mais desenvolvidos que não consideram os ganhos da convergência suficientes para suplantar o que é visto como um gasto para este grupo de países. Por outro lado, em certas faixas nos países menos desenvolvidos da união, há o sentimento que esta solidariedade vem com um “preço”, no sentido em que esta legitima uma superioridade que, em consequência, daria mais poder às maiores economias europeias para governarem a UE a seu bel-prazer. Utilizam como exemplo deste fenómeno as diversas ocasiões em que Angela Merkel e Emmanuel Macron, presidentes de estados-membros, se reuniram com terceiros como porta-vozes da UE, em vez de, por exemplo, membros da comissão europeia.
No entanto, este conceito de solidariedade não é só aplicado ao Orçamento da União e aos diversos projetos de desenvolvimento. A crise de refugiados sentida nos últimos anos é um exemplo claro. Não se pode esperar que os países que são a “porta de entrada” para estes os integrem sozinhos, sobretudo tendo em conta a escala significativa da migração.
Contudo, certos países, como a Polónia ou a Hungria, normalmente com maiorias nacionalistas e populações relativamente homogéneas, ignoram as necessidades dos países da costa do Mediterrâneo, recusando receber refugiados, justificando-se com eventuais problemas de aumento de criminalidade e de tensão social, entrando em confronto político e legal com a UE.
Com as eleições europeias a realizarem-se este mês de maio, é relevante para a Europa refletir sobre este princípio agora questionado. E não será um assunto a ser varrido para debaixo do tapete ou cuja discussão se possa adiar, como outros, pois não só é um tema importante dentro do atual panorama socioeconómico, como é um assunto que interessa, quer a Eurocéticos, quer aos que pretendem defender a União. Será que a Europa consegue viver com diferenças culturais e de nível de vida? Será que cresceremos mais em união ou será este um, ou “o”, ponto divergente no projeto europeu?
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