Sara Arêde
Também incluído no FEPIANO 54, publicado em Janeiro de 2025
Os anos universitários são frequentemente considerados “os melhores das nossas vidas”; contudo, essa visão romantizada encobre desafios significativos de saúde mental a enfrentar pelos jovens.
Desde o ensino secundário, a vida universitária passa a ser um tema do quotidiano. Não surpreende, portanto, que, ao cruzarem pela primeira vez as portas da faculdade, os alunos carreguem, entre livros e estojo, grandes expectativas para este novo capítulo das suas vidas. No entanto, com o avanço do ano letivo, o sonho começa a tomar o gosto de realidade, revelando inúmeros desafios.
Durante uma mesa redonda organizada pelo Serviço de Desenvolvimento e Carreira da FEP, no âmbito do Mês da Saúde e Bem-Estar, a psicóloga Maria João Padrão definiu equilíbrio emocional como a capacidade de se sentir entusiasmado de forma geral, ter ambições e de “fazer um amigo”. Embora simplista, segundo um estudo da Universidade de Évora, cerca de um quinto dos estudantes não alcança esta condição, revelando altos níveis de ansiedade, depressão, fadiga e alterações do sono.
“com o avanço do ano letivo, o sonho começa a tomar o gosto de realidade, revelando inúmeros desafios”
A vida universitária está repleta de fatores de stress, como a adaptação a novas metodologias de ensino, a sobrecarga de avaliações e a falta de apoio institucional. Muitos alunos sentem ainda a pressão para construir um percurso diferenciado, desdobrando-se entre múltiplos organismos estudantis, voluntariado, palestras, workshops e estágios, enquanto mantêm notas impecáveis e uma vida social ativa. Mas este esforço é incomportável, esgotando inevitavelmente os jovens.
O domínio social também desempenha um papel central. A integração no ambiente universitário é muitas vezes marcada por festas e convívios, onde o consumo de álcool e substâncias psicoativas é frequente. Este tipo de comportamentos colocam em risco a saúde mental, favorecendo mudanças de humor, ansiedade, depressão, comportamentos de risco, comprometendo relações e o desempenho académico e profissional. O enaltecimento deste tipo de atividade social normaliza, por outro lado, padrões de sono insuficiente que comprometem a recuperação física e mental e contribuem para sonolência diurna, acentuando os impactos negativos anteriormente mencionados.
Os estudantes deslocados enfrentam desafios adicionais. Para muitos, a entrada na universidade implica a separação do núcleo familiar e do apoio emocional direto com que contavam, enquanto ainda lidam com a necessidade de encontrar alojamento e gerir as próprias finanças, contribuindo para o aumento da ansiedade. Estes alunos tendem a lidar com solidão, frustração, insegurança e instabilidade, carregando um fardo emocional significativo.
Perante esta realidade, o tipo de apoio disponível aos discentes é crucial. Estudos indicam que a maioria recorre primeiro a amigos para partilhar questões de saúde mental. Torna-se, por isso, essencial que todos estejam despertos para sinais de desequilíbrio nos pares, como ataques de ansiedade ou pânico, desânimo persistente, dificuldades de relacionamento, comportamentos obsessivo-compulsivos ou mudanças nos hábitos alimentares.
“Os estudantes deslocados enfrentam desafios adicionais”
Apoiar alguém durante períodos tumultuosos é um gesto nobre, contudo emocionalmente exigente. Reconhecer os próprios limites é fundamental para que ajudar outros não comprometa o próprio bem-estar. Estabelecer limites não é egoísmo, mas sim autocuidado, essencial para estar verdadeiramente presente para os próximos.
Mas porque é que a ajuda profissional não é a escolha de eleição? Geralmente, deve-se aos elevados custos associados a esta via ou aos longos períodos de espera para marcação de consulta. As universidades tentam contornar estas barreiras com a oferta de serviços de apoio psicológico a preços acessíveis. No entanto, a escassez de profissionais agrava o sentimento de desamparo e os sintomas do estudante.
No caso da Universidade do Porto, a SASUP oferece um grande leque de especialidades médicas a preços acessíveis, nomeadamente, psicologia e psiquiatria. Já na FEP, o Serviço de Desenvolvimento e Carreira disponibiliza apoio psicológico gratuito, ajustando a frequência das sessões, presenciais ou online, às necessidades do fepiano. Nas sessões, os alunos poderão conversar com um corpo profissional experiente e receber sugestões de recursos adicionais, como podcasts, filmes ou séries, exercícios e práticas ajustadas a cada caso. Partilhando corredor com a sala dos 70 metros- palco de muitos nervos dos estudantes- a sala 236 proporciona um ambiente seguro para abordar qualquer questão que precise ser trabalhada. Este serviço organiza ainda workshops sobre temas pertinentes, como gestão de tempo ou inteligência emocional.
Não existe nenhuma fórmula mágica para eliminar os desafios da vida universitária. Contudo, cada estudante pode investir no seu próprio autoconhecimento, desenvolver estratégias de gestão emocional e implementar hábitos mais saudáveis. Muitas vezes, parece que é preciso uma mudança quase inatingível para abandonar situações de desconforto ou dor, mas, como bem ilustra James Clear na obra “Hábitos Atómicos”, são os pequenos passos que criam um verdadeiro potencial transformador para o bem-estar.
Apesar da grande diversidade de opiniões e visões, os profissionais concordam que hábitos como exercício físico regular, uma alimentação saudável e adequada ao estilo de vida, sono de qualidade, momentos de relaxamento e contacto com a natureza, exposição direta à luz solar e realizar consultas de rotina são fundamentais. Explorar abordagens como estas através de diversas bibliografias, podcasts, palestras ou workshops pode ser a chave para alcançar um maior equilíbrio.
Com este artigo, procura-se recordar aos estudantes universitários, especialmente aqueles que ainda tentam fazer da sua faculdade casa, que não estão sozinhos nesta jornada: existem recursos, pessoas e serviços prontos para ajudar a lidar com as adversidades da vida universitária. Cada caminho é único e não há um certo ou errado, resta apenas procurar aquele que faz mais sentido para cada momento, aceitar as falhas e celebrar cada vitória, mesmo as mais singelas.
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