Vivemos, atualmente, numa era obcecada pela felicidade a qualquer custo, onde a perfeição é o único padrão aceitável. Este ideal irreal sufoca-nos e cria uma geração de jovens aprisionados em expectativas inalcançáveis.

O caro leitor, que espero eu estar a deleitar-se nas páginas desta edição, com certeza já foi confrontado, na sua vida pessoal, familiar ou profissional, com palavras que o incitam na busca constante do bem-estar, do sucesso e da positividade. Existe uma obsessão contemporânea pela felicidade a todo o custo – uma pressão permanente para alcançar o corpo perfeito, o carro e/ou a casa perfeita, as férias perfeitas, a profissão perfeita, a relação perfeita, a vida perfeita, tudo perfeito. Não podemos fracassar, não podemos contentar-nos com o decente ou o suficiente.

Esta ilusão da felicidade ignora, por completo, a complexidade das emoções humanas, que são não só transitórias como multifacetadas, e geram sentimentos de inadequação, ansiedade e solidão que têm, espante-se!, um resultado completamente contrário – a incapacidade de lidar com o sofrimento e o agravamento da depressão e a ansiedade.

A influência desta cultura da felicidade é particularmente preocupante nos jovens, na medida em que se encontram numa fase da vida em que a identidade e a sensação de pertença estão a ser formadas. Os jovens procuram com frequência, nesse estágio de vida, a aceitação social e, os ambientes digitais (em especial as redes sociais) são a forma mais rápida de a obter. Contudo, esses espaços promovem um ideal irreal de vida perfeita e a felicidade inabalável – o que contribui para o desenvolvimento de expectativas irreais e padrões inatingíveis. 

Essa pressão não se limita às redes sociais e começa no ambiente familiar e escolar. Desde muito cedo, os jovens são incentivados a focar-se exclusivamente nas suas conquistas e sucessos – as dificuldades devem ser minimizadas e superadas rapidamente, e as falhas não são toleradas, sem espaço para a autorreflexão e compaixão. Assim, os jovens habituaram-se a um ambiente emocionalmente tóxico, incapazes de lidar com o fracasso de forma saudável e propenso para a frustração e inadequação.

Os jovens perderam a sua liberdade para serem autênticos – poderíamos referir que por imaturidade geracional, não fosse o narcisismo parental de afirmar que o seu filho é médico, advogado, economista ou engenheiro. Além disso, existe a necessidade de manter uma imagem – refletir a felicidade artificial que lhes é apresentada como verdadeira e que os afasta da sua própria verdade emocional. Muitos acabam por se desconectar da sua versão interna e real pela versão idealizada de si projetada por objetivos alheios. Esta alienação emocional, em que o jovem se distancia dos seus próprios e verdadeiros sentimentos e desejos, resulta numa sensação de vazio e solidão. 

Como ser animal que é, o ser humano procura sentir que faz parte do grupo. Como tal, qualquer desvio da norma social, como sentir-se triste ou ansioso, é algo errado ou anormal na sua perspetiva pessoal. Em vez de olharem para a saúde mental como uma parte integral e complexa da vida, os jovens são levados a acreditar que o sofrimento é um desvio a ser rapidamente corrigido, a ser reprimido até, o que impede a compreensão mais profunda e compassiva das suas próprias experiências emocionais.

Chega! Basta desta obsessão doentia com a felicidade. Para serem felizes também precisam de paz. Estamos a criar uma geração de jovens que se afogam em expectativas irreais que, na verdade, são uma grande mentira qual mito de Tântalo. Chega de vender essa merda como se fosse o único caminho para uma vida completa. Estamos a sufocar os nossos jovens, a empurrá-los para um abismo de depressão e ansiedade.

Esta cultura da felicidade não os deixa respirar, não lhes dá espaço para serem quem realmente são. Obriga-os a serem atores numa vida que não é a deles, a fingirem uma felicidade que não sentem. Vivem presos numa bolha de perfeição que rebenta à menor brisa de fraqueza. E quando estoura? Quem paga o preço são eles, que têm de lidar com a dor, o sentimento de fracasso e a impotência – e caros pais, não lhes ensinaram a fracassar, pois não? Os meninos(as) sempre foram “perfeitos(as)”. Isto não é uma vida, é uma prisão emocional.

Os jovens estão a ser moldados por uma sociedade que lhes diz o que sentir, o que fazer, o que pensar, e a tristeza, o medo ou o recuar é um desvio, uma falha pessoal. Não estamos a criar humanos saudáveis, estamos a criar autênticos robôs emocionais, incapazes de abraçar a sua própria complexidade humana. Basta! Já chega de maquilhar a realidade e de forçar sorrisos onde devia existir espaço para as lágrimas, para as falhas e para as aprendizagens reais – sendo as verdadeiras transformações e renovações do Eu. O sofrimento faz parte da vida e negá-lo cria uma sociedade mais frágil e desconectada de si própria.

Para combater a cultura da felicidade imposta, é essencial que pais, escolas e a sociedade em geral, assumam um papel ativo na promoção de uma abordagem mais equilibrada e saudável das emoções humanas. Aos pais, deve-se exigir que incentivem a aceitação de falhas e dificuldades como momentos de aprendizagem, sem julgamentos – promover um ambiente de apoio, empatia e diálogo aberto. Às escolas, deve-se exigir que se torne um local onde haja espaço para a resiliência e o autoconhecimento, um local onde os estudantes possam refletir e aprender com isso, onde o fracasso não seja um estigma nem que tudo o que conte seja o valor que aparece no topo das provas. Por fim, à sociedade exige-se uma mudança de narrativa, onde se promova uma visão mais realista e humanizada da vida. Fomos o país do fado que não tinha vergonha de cantar sobre a tristeza, a saudade e o sofrimento. Quem somos agora?

A luta contra a cultura da felicidade parece uma batalha invisível, uma luta interna e pessoal que muitas vezes nos faz sentir sozinhos, presos num vazio infinito. Mas o leitor(a) não está sozinho(a). A dor que eventualmente sente é real, e ela não pode ser simplesmente apagada com sorrisos forçados ou frases otimistas. É uma jornada difícil, um ato de coragem que não pode ser descurado. E mesmo que o mundo grite e nos empurre para a felicidade constante, caro(a) leitor(a) lembre-se: tem o direito de se sentir tal como está. Procurar ajuda e falar sobre os seus problemas não é sinal de fraqueza, mas sim de força. Estamos TODOS, de alguma forma, a lutar contra a escuridão e os nossos próprios demónios. E nessa luta, meu caro(a), não está nem nunca esteve sozinho(a).

Se considerares que precisas de ajuda profissional, podes contactar o Serviço de Consulta Psicológica da FPCEUP ((+351) 220 400 600) ou o SNS 24 (808 24 24 24 – Tecla 4 – disponível 24/7, com o apoio de psicólogos clínicos).