Opinião de Guilherme Sampaio
Também incluído no FEPIANO 55, publicado em Março de 2025
Os subsídios são essenciais para garantir um mínimo de dignidade a quem está numa situação vulnerável. No entanto, a sua aplicação não está a ser feita da forma mais eficaz e sustentável.
Os subsídios são um dos instrumentos mais utilizados pelo Estado português para garantir apoio social às famílias, fomentar o crescimento económico e reduzir desigualdades. No entanto, a sua aplicação tem gerado inúmeras críticas, tanto pela forma como são atribuídos como pelos efeitos perversos que muitas vezes provocam.
Um dos problemas mais evidentes do sistema de subsídios em Portugal é a dependência estrutural que cria, tanto a nível social como empresarial. O Estado tem vindo a reforçar, ao longo das últimas décadas, uma série de apoios que, apesar de terem um propósito social válido, acabam por gerar situações de acomodação.
O Rendimento Social de Inserção (RSI), por exemplo, foi concebido para ajudar pessoas em situação de pobreza extrema, garantindo um mínimo de sobrevivência. No entanto, há casos de famílias que recebem este apoio durante anos, sem qualquer progressão para a empregabilidade. A falta de fiscalização e a pouca exigência de contrapartidas tornam o RSI um mecanismo passivo, quando poderia ser um incentivo à integração no mercado de trabalho.
“A falta de fiscalização e a pouca exigência de contrapartidas tornam o RSI um mecanismo passivo.”
Deve existir um maior esforço para que sejam acompanhados de medidas ativas de integração no mercado de trabalho. O RSI deve estar associado a programas de qualificação e formação, garantindo que os beneficiários desenvolvam competências que os tornem aptos para uma vida profissional autónoma.
Deveremos recorrer a modelos como o francês, onde a partir deste ano, quem recebe o RSA (o equivalente ao RSI), necessita de fazer um contrato de trabalho que determina um plano de ação com objetivos de integração social e profissional, tendo um horário mínimo semanal de 15 horas.
Outro problema grave dos subsídios em Portugal é a falta de critérios rigorosos na sua atribuição. Muitos apoios sociais são concedidos sem um acompanhamento adequado da evolução da situação dos beneficiários. A ausência de um controlo eficaz permite que pessoas que já não precisam do apoio continuem a recebê-lo, enquanto outras, que poderiam beneficiar mais, enfrentam dificuldades burocráticas para aceder aos subsídios.
A fiscalização tem de ser reforçada para evitar fraudes e abusos, garantindo que os apoios chegam apenas a quem realmente precisa e durante o tempo estritamente necessário. Também seria importante adaptar os subsídios às especificidades de cada região, evitando soluções padronizadas que podem não responder às necessidades locais.
Nas empresas, a situação não é diferente. Muitos setores económicos vivem da constante renovação de subsídios públicos, sem que isso resulte numa verdadeira melhoria da sua competitividade. Certos apoios à inovação e à modernização empresarial acabam por ser encarados como um complemento ao orçamento das empresas e não como uma ferramenta para promover mudanças estruturais.
Para que isso não aconteça, é necessário tornar obrigatória a demonstração de melhorias concretas na produtividade e competitividade como condição para a continuidade dos apoios.
A atribuição de fundos nas empresas muitas vezes não é feita com base na real necessidade ou mérito dos projetos. Há inúmeros casos de fundos europeus canalizados para investimentos pouco produtivos, projetos que nunca chegam a ser concretizados ou empresas que desaparecem logo após receberem os apoios. O fenómeno das “empresas-fantasma”, criadas apenas para captar fundos públicos, ilustra bem este problema.
Além disso, há subsídios direcionados para setores pouco sustentáveis, que sobrevivem artificialmente graças ao apoio estatal, sem capacidade de gerar valor no longo prazo. Um exemplo disso são os sucessivos apoios ao setor agrícola e às pescas, que mantêm modelos de produção ultrapassados, em vez de incentivar a modernização e adaptação às novas exigências do mercado.
É fundamental que sejam direcionados para empresas com verdadeiro potencial de crescimento e inovação. Não faz sentido continuar a subsidiar setores que não demonstram evolução e que dependem cronicamente do apoio estatal para sobreviver. A atribuição de fundos deve ser feita com base em critérios rigorosos e exigentes, assegurando que os incentivos financeiros são canalizados para investimentos produtivos e sustentáveis.
A burocracia é outro entrave significativo à correta gestão dos subsídios em Portugal. O processo para aceder a muitos apoios é longo, complexo e, em muitos casos, pouco transparente.
Empresas e cidadãos enfrentam um número substancial de documentos, prazos e exigências administrativas, o que desincentiva muitos potenciais beneficiários de recorrerem aos apoios disponíveis. Por outro lado, a complexidade dos processos favorece aqueles que sabem contornar as regras e manipular o sistema para obter benefícios indevidos.
“A burocracia é outro entrave significativo à correta gestão dos subsídios em Portugal.”
A falta de transparência também se reflete na fiscalização da aplicação dos subsídios. Apesar de existirem entidades responsáveis por monitorizar os apoios concedidos, a fiscalização é insuficiente e muitas vezes tardia. Há projetos que recebem milhões de euros sem que haja um acompanhamento real dos resultados obtidos. Os relatórios de execução são frequentemente meros formalismos, sem consequências reais para os incumpridores.
Assim, é necessário reduzir a burocracia e tornar o processo de acesso aos subsídios mais simples e eficiente . A digitalização dos pedidos de apoio pode ser uma solução para eliminar barreiras administrativas e agilizar a atribuição de fundos. Além disso, a criação de um portal de transparência dos subsídios permitiria que toda a informação sobre os apoios concedidos fosse tornada pública, incluindo montantes, beneficiários e resultados esperados. Paralelamente, deveria ser implementado um sistema de auditorias regulares que avaliasse o impacto real dos subsídios, garantindo que cumprem os objetivos propostos e permitindo ajustes sempre que necessário.
Portugal precisa de uma cultura de responsabilidade, onde os subsídios sejam vistos como um meio temporário para impulsionar o crescimento e não como um fim em si mesmo. O país deve caminhar para um modelo mais sustentável, em que a inovação, o mérito e a produtividade sejam os verdadeiros motores do progresso.
Para garantir que os subsídios cumprem o seu verdadeiro papel, é fundamental apostar numa gestão mais transparente, com fiscalização rigorosa e exigência de contrapartidas claras. Os apoios sociais devem estar associados a programas eficazes de reintegração no mercado de trabalho e os incentivos às empresas devem privilegiar projetos com impacto real na economia.
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