Atualmente, tememos a inutilidade e a futilidade.  Vivemos com receio de ver uma série que à primeira vista não ensine nada. “Perder tempo” a pintar um desenho ou a jogar à bola com a parede apenas porque nos apetece parecem ser atividades que nos trazem culpa por “não servirem para nada”. As ideias de não estarmos a ser produtivos e de não acrescentarmos valor à sociedade prendem-nos numa espécie de ditadura da utilidade. Mergulhados numa espécie de cobrança a nós mesmos, achamos que, se não estamos a ser úteis, estamos a desperdiçar a nossa existência, assemelhando a vida a uma tarefa.   

“As ideias de não estarmos a ser produtivos e de não acrescentarmos valor à sociedade prendem-nos numa espécie de ditadura da utilidade

Nos dias de hoje, vivemos numa era em que o conceito de produtividade –  fazer mais em menos tempo – é confundido com fazer sempre mais e mais. É incentivada a produção contínua mesmo que esta signifique um declínio da qualidade do trabalho produzido. Assim, a eficiência é questionada e a palavra “pausa” apresenta uma conotação negativa. Comportamo-nos como se de máquinas nos tratássemos, não deixando espaço para desligarmos efetivamente e cultivarmos competências que delas nos distinguem. Ao mesmo tempo, quando temos a ousadia de fazer um intervalo ou ingressar num novo projeto parece que temos de o fazer sempre com o objetivo primordial de ser bem sucedidos e para colocar o LinkedIn sempre mais atrativo. 

Derivados das ações acima enumeradas, é frequente o sentimento de culpa por descansar, a sensação de que nunca se alcança o suficiente e o medo de aparentar ser preguiçoso diante dos outros. Estes pensamentos podem constituir o caminho para o desenvolvimento de patologias como a insónia crónica, a ansiedade, o burnout e a depressão. 

Neste contexto, a futilidade – aquilo que aparentemente não serve para nada, que não gera oportunidades nem currículo – torna-se, não apenas necessária, mas também transformadora. Investir parte do nosso tempo em atividades que não se assumam como um meio para atingir um fim, mas sim por puro prazer são essenciais para acalmar a mente e alegrar a alma. É no silêncio interior e exterior que se liberta espaço para pensar e para criar. 

Na realidade, dedicar algum espaço da nossa vida ao que achamos ser inútil ou fútil é o primeiro passo para ter a cabeça fresca, livre e leve para encarar o trabalho e, portanto, aumentar a probabilidade de gerar novas soluções e formas de ver o mundo.

Desta forma, torna-se cada vez menos provável ser um mero acaso o facto da palavra “futilidade” ter nela presente a palavra “utilidade”.