Durante a abertura do 5º Congresso dos Jornalistas, realizado em janeiro, Marcelo Rebelo de Sousa usufruiu da ocasião para destacar os 50 anos do 25 de abril, como uma oportunidade para refletir sobre as mudanças ocorridas no jornalismo e na comunicação. Também o slogan do congresso “Jornalismo Sempre” remete à mensagem dos 50 anos da Revolução, “25 de Abril Sempre”.

Durante o regime do Estado Novo em Portugal, sob a liderança de António de Oliveira Salazar e, no fim, Marcelo Caetano, a censura desempenhou um papel crucial no controlo de informação e na supressão da liberdade de expressão. A medida foi estabelecida pelo Governo da Ditadura Militar e, não obstante alguma indignação, a censura foi imposta em Portugal, logo após o golpe militar de 1926. Desta forma, esta é um organismo do Estado que tem como propósito supervisionar, controlar e intimidar a imprensa e os jornalistas.

Os jornais que eram considerados desagradáveis ou incómodos para o regime eram apreendidos, os textos ou partes de textos eram censurados e alguns jornalistas e editores acabavam por ser detidos. Ou seja, a vigilância era omnipresente. A “censura prévia” ou “exame prévio” que se refere à intervenção antecipada nos textos a serem publicados antes da sua publicação efetiva, impedia os órgãos de comunicação social de divulgar notícias ou comentários considerados impróprios pela Ditadura.

Desta maneira, os censores utilizavam o conhecido lápis-azul (e de outras cores) para apagar o que não desejavam que fosse divulgado – alguns jornalistas fizeram uso da sua imaginação por forma a amenizar este impedimento. Adicionalmente, a censura não se limitava apenas à imprensa, mas também a toda a produção cultural: rádio, literatura, cinema e teatro.

Assim, o movimento iniciado com o movimento de 25 de abril encerrou um período de quase meio século de ditadura e acabou com um regime que reprimia as liberdades e os direitos fundamentais, o que, consequentemente, interferia com a liberdade de imprensa.

De destacar que os Meios de Comunicação Social foram uma peça fulcral no que toca às ações que ocorreram na madrugada de 25 de abril de 1974. De facto, este foi um processo que foi iniciado através de duas rádios que foram selecionadas para emitirem as duas primeiras senhas para o movimento. Assim, a rádio foi um dos principais meios de comunicação social durante o 25 de abril de 1974 — permitiu que a revolução fosse amplamente divulgada pelo país e, mais tarde, foi através da rádio que os portugueses ouviram as primeiras notícias sobre os eventos e as reações das populações.

“Na atualidade, a atividade jornalística enfrenta uma grave crise, em Portugal.”

Por outro lado, na atualidade, a atividade jornalística enfrenta uma grave crise, em Portugal. Cinquenta anos após o 25 de abril, verifica-se que há um número significativo de demissões no setor, o que tem causado um impacto adverso nas receitas. Nos últimos anos, o panorama dos Meios de Comunicação Social apresentou uma grande alteração, com as publicações e a publicidade online a ameaçar significativamente este meio.

Não é segredo que a indústria tem se esforçado para acompanhar. Segundo Mafalda Anjos, antiga diretora da Visão, a disponibilização, de forma gratuita, de conteúdos online, apesar de resultar num aumento da leitura dos veículos de comunicação, não beneficiou tanto os jornalistas como beneficiou as grandes plataformas tecnológicas que disponibilizam os conteúdos. Posto isto, a indústria procurou corrigir este problema através das assinaturas e subscrições, no entanto, apesar de ser uma boa base para a resolução das dificuldades, só é viável quando as pessoas estão dispostas a apoiar estas marcas.

Mais recentemente, um dos maiores grupos de comunicação social de Portugal, o Global Media Group, proprietário da Rádio Nacional TSF, do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias, anunciou um programa de rescisões de contratos, alegando necessidade de enfrentar uma situação financeira adversa. O pagamento dos salários de dezembro foi atrasado em cerca de 25 dias. Este foi o momento em que o país percebeu que desconhecia quem era o detentor do Global Media Group. Em setembro de 2023, um fundo de investimento com sede nas Bahamas, um paraíso fiscal, passou a deter 51% da empresa que controla, direta e indiretamente, 50,25% do GMG e 22,35% da agência de notícias Lusa. O presente caso demonstra que os atuais modelos de negócio utilizados nos meios de comunicação social podem trazer riscos de que surjam interesses económicos omissos e com outras finalidades que o jornalismo não tem.

Por outra perspetiva, podemos também analisar o contributo da crescente relevância da Inteligência Artificial, como um potencial fator nesta crise que afeta o jornalismo. Apesar do crescente interesse por esta, os efeitos, sejam positivos ou negativos, da inteligência artificial na indústria do jornalismo e no ambiente de informação, ainda são pouco compreendidos.

Se por um lado, existe o argumento que a IA tem a capacidade de aumentar a eficiência e produtividade nas organizações de comunicação social. Por outro lado, em janeiro deste ano, especialistas testemunharam perante o Senado norte-americano sobre questões de privacidade, tecnologia e legislação. Assim, afirmaram que a Inteligência Artificial é um fator contributivo para o declínio do jornalismo, declínio este provocado pelas grandes empresas tecnológicas. Além disso, foi também abordado o tema da propriedade intelectual, em particular, a utilização do trabalho realizado por jornalistas para “treinar” os modelos de Inteligência Artificial; e foram levantadas preocupações quanto aos riscos crescentes da desinformação gerada pela IA.

Adicionalmente, a Google lançou, recentemente, um programa para editores, que oferece acesso a ferramentas de IA por forma a ajudá-los a produzir conteúdo. Em resposta, a Bynder, empresa de gestão de ativos digitais, realizou uma pesquisa com 2000 consumidores no Reino Unido e nos Estados Unidos da América, tendo descoberto que os consumidores consideram que o artigo jornalístico é o principal tipo de documento destinado a publicação que deve ser escrito por um ser humano.

“Os meios de comunicação necessitam de se reinventar ou de continuar a se reinventar.”

De facto, a crise dos media é algo que envolve uma multiplicidade de causas e vários fatores que não foram aqui discutidos. No entanto, tendo em conta todas estas questões fica evidente que os meios de comunicação necessitam de se reinventar ou de continuar a se reinventar. Como afirmou o Chefe de Estado no 5º Congresso dos Jornalistas “O jornalismo reinventa-se todos os dias nos antiquíssimos, antigos, novos e novíssimos meios para tentar não desaparecer” e, posto isto, “(…) o 25 de Abril ficará. Ficará sempre. E com ele a Democracia, sempre. E com ela o Jornalismo sempre”.